sexta-feira, 23 de abril de 2010

....MULTIDÃO......

Gosto da multidão. Gosto de me misturar àquela gente toda, gente sem histórias visíveis, sem sentimentos na cara, sem emoção no olhar.....caras sem identidade. Gosto de ver os andares, os vestires...É difícil ver os olhares, olhares ausentes ou metidos no chão. Não sei que graça esses olhares encontram no chão. O chão não me interessa. Interessam-me as caras e é pra elas que vou tecendo histórias, inventando nomes, amores, encontros, desculpando ausências .....Todas essas caras estão na minha mão. Sinto-me um deus, faço e desfaço, crio vidas sem me importar com vontades.
Sento-me na calçada para observar melhor. Inventar vidas não é coisa simples, mas faço..... Paralelamente à minha criação está a trilha sonora de qualquer multidão urbana que se preze, as vozes dos ônibus e carros...vozes barulhentas em todos os tons possíveis e imagináveis, vozes que não se calam nem por um segundo. Talvez sejam os gritos das mulheres que esbravejam as rudezas da vida, gritos de homens estressados e impacientes, gritos de crianças que querem chegar logo em casa pra brincar, gritos de mocinhas incautas que querem adiantar o relógio para o encontro com o príncipe encantado, gritos dos velhos que,com medo da morte, clamam por mais tempo de vida. E eu fazendo a leitura desse vozerio e manipulando minhas marionetes-gente.
Em meio à minha criação, uma voz diferente de todas se fez ouvir...um tilintar ao meu lado. Alguém passou e vendo-me ali sentada, atirou-me ao colo, algumas moedas. Quem grita e esbraveja agora sou eu e com a minha própria voz...”Como? Dar vida e alma a tantas caras não tem preço não,moço!”. Ofendi-me, olhei o insensível e lá ia ele a passos firmes, “enternado” com uma maleta 007 (será que há alguma mais moderna? mochila não tem glamour....rsrs) com ares de quem quer e pode comprar meio mundo. “A mim não, violão!” Levanto-me, jogo as moedas no bueiro (reconheço que não foi uma atitude ecologicamente correta.....perdão!) e vou embora. Minha criação tinha sido interrompida, deixei de ser um deus. Pobres caras que continuarão sem histórias nessa história...
Resolvo caminhar.....Agora sou mais uma cara sem alma nessa multidão. Chego a um jardim. Sento-me num banco. Ali não é necessário criar. Tudo tem vida. Tudo é vida....as flores, o gramado, as árvores.... E a vida mais linda... almas com identidade...as crianças em suas brincadeiras e vozerio alegre, as mulheres nas conversas de comadres,os casaizinhos que, sussurrando, devem estar fazendo juras de amor eterno, os pássaros que, ouvindo tudo, espalham as novidades uns aos outros com seus gorjeios. E eu ali, sentada....uma cara inexpressiva. Carrego em mim toda a multidão que por causa de algumas moedas ficou sem vida. Eu sou a própria multidão...sem nome, sem história, sem sentimento...destoando de tudo que ali existe.....

Um comentário:

  1. multitud de personas,son multitud de historias,de vidas y alegrías ,se mezclan sin importar credos ni ideas formando un crisol de rasas
    besoss

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