quarta-feira, 31 de março de 2010

EU, OS DIAS E FERNANDO PESSOA


Recostei-me, fresca e perfumada, nas almofadas da cama. Acendi o abajour e peguei um livro. Essa é a melhor maneira de se chamar o sono quando ele parece distante e fugidio.
Li três ou quatro páginas e deixei-o cair sobre o peito. Era o sono que, obediente, me atendia? Ledo engano....Era uma avalanche de sentimentos desordenados que começaram a brotar dentro de mim. Não consegui contê-los...começaram a tomar imponência e a apertar minha garganta. Eram como mãos invisíveis que me sufocavam. Não sei de onde eles saíam....se do coração, da alma, das vísceras ou de algum ponto desconhecido do meu corpo. Lutei contra eles...ferozmente....Enxotei-os...Quis arrancá-los de dentro de mim, um a um....E eles, invencíveis, pareciam dispostos a me levar a algum sacrifício. Tive tanto medo...medo de ser devorada, pedaço a pedaço...medo de me atirarem contra a parede até que corpo e alma se misturassem...Senti-me como um pedaço de papel de seda sem asas voando no meio de um furacão. Gritei, pedi ajuda...ao meu Anjo...e ele veio...
Segurou minhas mãos e com um leve sopro, abriu dentro de mim um caminho...Com o olhar sério e autoritário, transformou os sentimentos em águas cristalinas, ordenando que se desviassem para o caminho...E as águas caudalosas não se acanharam e, como se no interior do solo estivessem, seguiram seu destino para brotarem em duas fontes...os meus olhos que o Anjo acabara de beijar...E chorei...chorei...chorei até me esvaziar de toda aquela água carregada de sentimentos.
Cansada, adormeci ainda com as fontes jorrando......
....acordei e estava ali, ao meu lado, o meu livro,encharcado e aberto onde eu pude ler....

“Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Nada há mais simples
Tem só duas datas – a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra cousa todos os dias são meus.”
(Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa)

Todos os dias são meus...E o que eu estou fazendo dos meus dias?
Ah, Fernando Pessoa, acho que só tu me entendes! Oferece-me teu ombro e recita-me teus poemas!... Só assim de alma lavada, poderei tomar posse dos dias, dos dias que são meus....dos dias que me dizes...são todos teus,não os desperdices....

2 comentários:

  1. Lulu e Fernando Pessoa, ambos, incríveis! Lindo texto!

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  2. no sos simplemente una mujer de este planeta sos una mujer del universo como vos no hay otra igual
    besossss

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